O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem se tornando protagonista e referência internacional em um domínio relativamente novo e complexo: o do Direito Ambiental, tema sobre o qual já julgou cerca de três mil processos e para os quais tem apresentado soluções inovadoras e sólidas o suficiente para se transformarem em paradigmas, segundo reconhecimento de autoridades internacionais do setor.
Em recente visita ao Tribunal, o coordenador de Direito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Bakery Kante, foi efusivo: “A atuação do STJ na área ambiental não é apenas boa. É mais que isso, é excelente”. Para ele, a jurisprudência consolidada pela Corte nos últimos anos representa uma “atitude pró-ativa” no esforço, sempre árduo, de se progredir no campo da proteção ao meio ambiente.
Visão semelhante foi expressa por Sheila Abed, presidente da Comissão Mundial de Direito Ambiental, órgão ligado à União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Ao assinar, meses atrás, um convênio com o STJ para a criação do Portal Judicial Ambiental – que irá reunir, na internet, legislações, jurisprudências e doutrinas jurídicas das cortes dos países que integram o Sistema Nações Unidas –, a executiva enobreceu o pioneirismo do STJ na defesa do meio ambiente, destacando-o como “um exemplo a ser seguido por países de todo o mundo”.
O que enche os olhos desses e outros especialistas, na área ambiental, é a combinação de dois fatores que, somados, fazem do STJ um tribunal ímpar nessa seara. O primeiro é a transparência e objetividade do STJ no processo decisório das causas em que intervém. O segundo, o protagonismo do Tribunal em iniciativas voltadas à cooperação interinstitucional para o aprimoramento do Direito Ambiental, dentro e fora do país.
Pragmatismo e acuidade
Nas decisões, chama atenção o pragmatismo e acuidade com os quais os ministros da Casa têm fundamentado seus votos. Ao todo, já tramitaram pelo STJ cerca de 3 mil processos que tratam de temas ambientais. As ações envolvem desde questões sobre licença ambiental para construções até a instalação de aterros sanitários, desapropriação de imóveis em áreas de preservação e escoamento de esgotos em rios, entre outras. Nesses processos, sobressai a disposição dos magistrados em compatibilizar as infindáveis normas específicas que regem a matéria (cerca de 15 mil) ao conjunto maior da legislação; e a certeza de que o benefício da dúvida deve prevalecer em favor do meio ambiente – o que, no Direito Ambiental, traduz-se na expressão in dubio pro ambiente.
“O Brasil não precisa de juízes ativistas na área ambiental. Precisa de magistrados que façam o básico, que é aplicar a lei”, afirma o ministro Herman Benjamin, um dos reconhecidos especialistas do STJ nessa área. A julgar pelo impacto de suas decisões, porém, o Tribunal tem feito mais que isso. A busca por decisões justas e adequadas tem levado à adoção de novas racionalidades jurídicas nos julgamentos, resultando em importantes inovações na jurisprudência.
Um exemplo foi a admissão da inversão do ônus da prova em casos de empresas ou empreendedores acusados de dano ambiental (Recurso Especial n. 972.902/RS). No entender do STJ, cabe ao próprio acusado provar que sua atividade não enseja riscos à natureza. A abordagem, recebida com louvores entre os especialistas, é contrária à regra geral em vigor no sistema processual brasileiro, segundo a qual o ônus da prova incumbe ao autor.
Outra mostra de que o STJ tem atuado em prol de uma interpretação mais moderna da legislação é o reconhecimento do caráter transdisciplinar do Direito Ambiental. Nesse sentido, vale citar um posicionamento da Segunda Turma do Tribunal, ao manter uma decisão que proibiu a queimada de palha como método preparatório para colheita de cana-de-açúcar (Recurso Especial n. 1.094.873/SP). Dispondo-se contra uma leitura meramente dogmática da legislação, o relator, ministro Humberto Martins, destacou que a interpretação das normas que tutelam o meio ambiente não comporta apenas a utilização de instrumentos estritamente jurídicos. “As ciências relacionadas ao estudo do solo, ao estudo da vida, ao estudo da química, ao estudo da física devem auxiliar o jurista na sua atividade cotidiana de entender o fato lesivo ao direito ambiental”, afirmou.
Para o presidente do STJ, ministro Cesar Asfor Rocha, tais manifestações revelam a disposição da Corte em consolidar uma jurisprudência mais ativa e avançada na área do Direito Ambiental. “Estamos conferindo normatividade a princípios que vinculam a ação presente do homem a resultados futuros, revigorando uma concepção ética da tutela ao meio ambiente”, diz. Na avaliação de Cesar Rocha, é a leitura ao mesmo tempo jurídica e ecológica da legislação que faz com que o STJ obtenha significativo reconhecimento internacional por sua atuação na área ambiental. O diretor-geral do Pnuma, Achim Steiner, concorda. Ao receber, no ano passado, um CD com a jurisprudência do Tribunal em matérias ambientais, o representante da ONU não escondeu seu entusiasmo. “Fiquei impressionado”, disse.
Iniciativas institucionais
Interpretar a lei de forma mais amiga da natureza é a parte mais visível da atuação do STJ na área ambiental, mas não a única. Ciente de seu protagonismo, o Tribunal tem aliado esse esforço à execução de iniciativas institucionais que visam consolidar ainda mais a importância do Direito Ambiental. Exemplo disso é o empenho na efetivação de leis para contribuir com a missão de proteger o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Em abril deste ano, foi anunciada a instalação de novas varas ambientais em regiões estratégicas como a Amazônia Legal. Criadas por lei de iniciativa do próprio STJ, as novas circunscrições judiciais contribuirão para dar mais agilidade ao julgamento de processos envolvendo crimes contra a natureza, nos próprios locais em que estes costumam ocorrer.
Outra iniciativa nesse sentido foi a assinatura de convênio para a criação do Portal Judicial Ambiental. Pelo acordo, o STJ será o primeiro tribunal do mundo a disponibilizar sua jurisprudência sobre meio ambiente no site, cujo projeto é coordenado pela Comissão Mundial de Direito Ambiental. O objetivo é subsidiar e capacitar juízes de todo o mundo na aplicação do Direito Ambiental envolvendo temas relevantes como combate à poluição, proteção da biodiversidade e questões relativas às mudanças climáticas.
Para Bakery Kante, coordenador de Direito do Pnuma, tal tipo de cooperação é fundamental. “O intercâmbio de experiências dos magistrados pode fazer do Judiciário um poder capaz de garantir proteção ambiental em âmbito global, independentemente das fronteiras nacionais”, afirma. “É essa cooperação que faz com que a causa ambiental ganhe a relevância que merece. É nisso que acreditamos.”
retirado do site do STJ
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