RIO - Ele já brigou com a Mattel, fabricante da Barbie, pelo uso de PVC na fabricação das famosas bonecas. Também arrumou problemas com a gigante da tecnologia Apple, acusando a marca de realizar seus produtos com substâncias tóxicas. No momento, luta para incentivar o governo dos Estados Unidos a aumentar a regulamentação da indústria química americana. Rick Hind, diretor legislativo do Greenpeace, parece não ter medo de desafios. Ele promete enfrentar lobbies poderosos ao denunciar que os efeitos de 70 mil substâncias químicas produzidas nos EUA são ainda desconhecidos. Apenas 800 desses produtos são, segundo ele, conhecidos e regulamentados pelo governo americano.
Para o ambientalista, são grandes as chances dos inúmeros produtos, vendidos para milhares de pessoas no planeta, possuírem substâncias nocivas à saúde.
Recentemente, ele mostrou-se cético quanto ao comércio de emissões de carbono. O método, previsto no artigo 17 do Protocolo de Kioto, permite aos países negociarem a redução através de trocas de compensações. Quem consegue atingir a meta e apresenta com sucesso um excedente, pode, através de artifícios financeiros, “compensar” a produção de nações menos responsáveis.
De fala pausada e tom contundente, Hind não é dado a respostas evasivas. Ele costuma se explicar quase sempre com "sim" ou "não". Para o ambientalista, a solução para aumentar o conhecimento de substâncias químicas é passar a estudar grupos de compostos e não estudá-las uma de cada vez. É que o tempo de pesquisa, se não acelerado e organizado, pode não ser suficiente para proteger a vida de consumidores.
O senhor afirma que, dos 70 mil ingredientes químicos produzidos, apenas 800 deles são regulamentados pela Environmental Protection Agency (EPA, a agência de proteção ambiental dos Estados Unidos). A situação se repete no restante do mundo?
A regulamentação de produtos químicos nos Estados Unidos é muito fraca. No mundo inteiro, na verdade. Na Europa, a União Europeia (UE) adotou a Legislação de Controle de Produtos Químicos, o que melhorou um pouco o controle. Todos os produtos químicos fabricados ou importados pela UE, em quantidades maiores que uma tonelada por ano, passam por um processo de registro, avaliação e autorização de uso. Com a referência, países com o controle fraco poderiam se espelhar no exemplo para troca de informações sobre determinados ingredientes químicos.
O controle maior por parte dos europeus ajuda a entender melhor o que causam e produzem os ingredientes?
Sim, mas o mundo, em geral, ainda não tem muitos detalhes sobre o modo como funcionam diversos elementos químicos. Alguns dos maiores riscos para a saúde humana podem ser ainda totalmente desconhecidos dos consumidores.
Por que diz isso?
Por probabilidade matemática. Se há milhares de ingredientes que ainda não foram estudados, as chances de algum deles ser prejudicial para humanos é grande. É algo lógico. Existe também a questão das combinações. Um ingrediente químico em contato com outros pode produzir novas variações com efeitos colaterais horríveis. Há muito a ser estudado ainda.
Como compensar este atraso?
Talvez estudando-os em grupos. Se formos analisar cada produto de uma vez, verificando o modo como são constituídos e suas consequências, não conseguiremos nada em décadas. Se dividirmos o desconhecido por grupos ou semelhanças estruturais, como, por exemplo, metais pesados, poderemos avançar mais rapidamente. É uma metodologia que facilita a vida dos pesquisadores.
Estudo recente do Instituto Blacksmith (grupo americano que limpa locais contaminados), realizado em 49 países, concluiu que a poluição por chumbo, fundição e reciclagem (muitas vezes a partir de baterias de carro) representaram o maior risco para a saúde humana em 2012.
Como lidar com o problema?
Precisamos estudar elementos alternativos. Descobrir novas maneiras de lidar com esses problemas. A boa notícia é que muitos países já abandonaram, por exemplo, a gasolina com chumbo. Tubos de raios catódicos, usados para gerar imagens na televisão, que vinham cheios deste elemento, também foram abandonados. São sinais claros de mudança na indústria. Vale lembrar que a exposição em excesso ao chumbo pode levar a problemas nos rins, dificuldades de aprendizagem, deficiências de crescimento e até perturbações nervosas.
O chumbo é cancerígeno. Sobre os outros milhares de compostos não conhecidos e regulamentados, muitos também podem causar a doença?
Sem dúvida. Uma pesquisa demonstrou que, só aqui nos Estados Unidos, pelo menos 40% da população vai ter câncer em algum momento da vida. É um dado preocupante. Um problema que pode ser consequência de ingredientes químicos ainda não conhecidos. Um estudo dos produtos pode nos ajudar a encontrar soluções alternativas para tentar diminuir essa estatística.
De que maneira o Greenpeace pode ajudar a fortalecer a regulamentação de ingredientes desconhecidos?
Entrando em contato com governos e empresas, pressionando-os por mudanças. É importante lembrá-los de que os alvos não são apenas os consumidores, mas também os funcionários que trabalham nas indústrias e que fabricam estes elementos. Estas pessoas ficam expostas diariamente ao perigo.
Existe um lobby forte da indústria contra as investigações sobre os produtos fabricados e usados?
Sim, existe. Usar o que sempre usaram sai mais barato. Para investir em novos ingredientes, comprovadamente mais seguros, a indústria precisará investir em pesquisa. Isso custa muito dinheiro. Mudar as composições de determinados produtos pode custar demais para algumas empresas. Só que a inovação e a busca por segurança são extremamente necessárias.
Uma de suas lutas é por uma maior regulamentação da indústria química americana, que exporta centenas de produtos para o restante do mundo. O que espera deste segundo mandato do presidente Barack Obama?
Torcemos para que o presidente consiga adotar atitudes eficazes nessa área. Até porque isso a tem a ver com a nossa própria segurança. A tragédia de Bhopal, na Índia (desastre industrial que ocorreu na madrugada de 3 de dezembro de 1984, quando 40 toneladas de gases tóxicos vazaram na fábrica de pesticidas da empresa norte-americana Union Carbide) ainda gera ecos até hoje. A grande dificuldade do presidente Obama é passar pelo congresso americano.
Qual o problema exatamente?
Os republicanos estão muito ligados ao lobby da indústria química. Houve uma grande preocupação sobre o tema após o 11 de setembro, mas o governo anterior controlava a EPA. Nada era feito com facilidade naquela época. Sabemos, porém, que este é um assunto que interessa ao presidente Obama, desde a época em que ele era senador pelo estado de Illinois. Neste período, Obama mostrou-se muito interessado pelo tema. Illinois é um estado, aliás, com muitos investimentos do tipo.
O senhor já se posicionou ceticamente em relação ao comércio internacional de emissões de carbono para que países possam negociar modos de alcançarem suas metas de redução de carbono. Por quê?
Não deveríamos procurar maneiras para as pessoas continuarem a poluir. Se as indústrias realmente planejam reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, vão precisar seguir nessa direção de qualquer maneira. Pode ser aberto um péssimo precedente se começarem a pagar outras empresas, em outros países, para que estas poluam menos. O método já é adotado na Europa, mas não há provas científicas que funcione. Há diversos estudos sérios que demonstram a ineficácia e a falta de transparência deste tipo de medida. Cheira a trapaça.
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