As restrições legais impostas em área de propriedade privada, localizada na Mata Atlântica, não configuram desapropriação indireta do imóvel. No caso, inexiste confiscação de área ou desapossamento pelo Poder Público, que imporia indenização ao proprietário. A 4ª Câmara Cível do TJRS entendeu que a proibição do corte da mata nativa em terreno da Agropecuária Continental S/A, situada na poligonal da Mata Atlântica, representa apenas limitação administrativa, pois é unilateral, geral, imperativa e não confiscatória.
O Colegiado deu provimento ao recurso de apelação do Estado, julgando extinta a ação de indenização por desapropriação indireta movida pela empresa, em face da prescrição. A Justiça de 1º Grau havia julgado procedente a demanda e determinado ao Estado pagar R$ 20.846.034,98 à autora do processo.
A Agropecuária também recorreu ao TJ, solicitando que fosse retificada a indenização para R$ 145.084.141,59, valor total da propriedade. Com a restrição do corte à mata nativa, alegou estar impedida da exploração econômica do imóvel.
Prescrição
O relator, Desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, afirmou que o caso é de mera limitação administrativa do uso da propriedade. Nesse sentido, o prazo prescricional a ser observado é o qüinqüenal do Decreto 20.910. A suspensão das autorizações de corte ocorreu em 12/6/97. E, o processo foi ajuizado em 17/05/04. Caso fosse considerada a ocorrência de desapropriação indireta, a prescrição seria vintenária.
Segundo o magistrado, a proibição de desmatamento da floresta nativa não retira o potencial econômico da propriedade, que pode ser explorada de outras formas lucrativas. Não houve, disse, o alegado esvaziamento econômico da área devido à impossibilidade de cortar mata nativa.
Proteção ambiental
O magistrado salientou que o Poder Público Estadual, ao delimitar a poligonal da Mata Atlântica, observou diretrizes contidas na legislação federal, Código Florestal Federal (Lei nº 4.771/65). “Nada mais fez do que assegurar um meio ambiente ecologicamente equilibrado, utilizando-se dos recursos que lhe são facultados pela Constituição Federal.”
A restrição no uso da propriedade já existia quando a mesma foi adquirida pela Agropecuária Continental, em 1985. O desmatamento especulativo de mata nativa é legalmente proibido no Rio Grande do Sul, segundo as Leis Estaduais nº 7.989/85 e 9.519/92 e Decreto Estadual nº 36.636/96. Essa vegetação se enquadra na definição legal de área de preservação permanente.
O Desembargador Ricardo Pastl afirmou que a autora também não possui direito adquirido por ter conseguido algumas autorizações para desmatar até 1988, em virtude de lacunas ou de incorreta interpretação da legislação. “Não há espaço para este tipo de intervenção especulativa, incumbindo a todos, sem exceção, o dever de observar tais regramentos, adequando-se a tal realidade.”
Função socioambiental da propriedade
O Desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl ressaltou, ainda, que o Direito Ambiental afeta o exercício do direito de propriedade. A função social da propriedade, disse, também denominada função socioambiental da propriedade, “rompeu com o modelo privatista de direito absoluto e individual da propriedade, revelando um novo paradigma.” A Constituição Federal dispõe que a Mata Atlântica é patrimônio nacional.
Não pode haver dúvida, acrescentou o magistrado, que a área de propriedade da autora está situada na Poligonal da Mata Atlântica, conforme delimitação contida no Decreto Estadual nº 36.636/96. O Código Florestal Federal, frisou, desde 1965 já previa ser limitado o exercício do direito de propriedade sobre as florestas existentes, bem como a Resolução do Conama nº 278/01.
Votaram de acordo com o relator os Desembargadores João Carlos Branco Cardoso e Agathe Elsa Schmidt da Silva.
Proc. 70027847979
Extraído do site www.editoramagister.com
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